Mais uma “meia-polícia”? (Parte 1)
O Brasil é o único lugar no mundo onde a atividade de polícia nos Estados é composta por duas polícias que realizam, cada uma, a metade do chamado ciclo completo de polícia; ou seja, cada uma faz a metade do que deveria fazer para funcionar de forma eficiente e eficaz. Explico:
O Ciclo Completo de Polícia, compreende as atividades de: prevenção do crime, prisão em flagrante-delito, investigação criminal, coleta de provas, feitura do inquérito, e remessa ao Ministério Público. Ou seja a atividade policial compreende desde a prevenção até a repressão do crime.
Doutrinariamente há uma distinção entre as atividades de polícia administrativa e de polícia judiciária. A polícia administrativa faz a parte da prevenção do crime e à polícia judiciária cabe a repressão. Note que estamos falando de atividade e não de instituição.
No âmbito da União, as instituições existentes (Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal) já fazem o chamado “ciclo completo de polícia”, ou seja, em suas atividades realizam desde a prevenção até a repressão ao crime.
O mesmo não ocorre no âmbito dos Estados com suas instituições (Polícia Militar e Polícia Civil). Nos Estados, cabe a Polícia Militar as atividades de prevenção através do policiamento ostensivo fardado, a prisão em flagrante delito, e a condução das partes envolvidas à delegacia de polícia, para isso lavrando o Chamado B.O. – Boletim de ocorrência – e ai encerram as atividades. Na sequencia, iniciam-se as atividades de polícia judiciária pela Polícia Civil, tais como: ouvidas das partes, coleta de provas, perícias, investigações criminais, captura de eventuais foragidos, enfim, tudo que for necessário para confecção da peça “inquérito policial” e sua consequente remessa ao ministério público.
A visível consequência dessa repartição de atividades por instituições pode ser sumariamente descrita como:
a) No local de crime – erros no isolamento do local, destruição de provas, arrolamento apressado de testemunhas – isto porque na própria formação do policial militar esses conteúdos são vistos de forma apressada e sem significado para o exercício de suas atividades, pois não lhes pertence tal atuação. Limita-se ao campo teórico, pois é algo que será exercido pela polícia civil. É comum na cena do crime o amontoado de gente por todo lado vendo o cadáver e passando por cima das eventuais provas, alterando todo o local.
b) Boletins Policias mal feitos ou incompletos, como peça introdutória para orientações ou pistas para atuação das atividades de polícia civil;
c) Nas Delegacias – de posse dos Boletins de Ocorrência, e nas muitas vezes em que não se decide pela confecção do Flagrante Delito, adiam-se as atividades para a feitura de um inquérito policial com rito normal comum que depois de iniciado duram cerca de 30 ou no máximo 60 dias para ouvida das partes, coleta de provas, investigações, captura de foragidos, e finalização com a remessa da peça (puramente informativa) ao Ministério Público, a quem cabe oferecer ou não denúncia à Justiça de que houve crime ou não. Diga-se das dificuldades muitas vezes de remontar a cena do crime quando as provas no local do crime não foram coletadas corretamente ou foram apagadas.
d) O ministério Público examina a peça e muitas vezes constata a falta de provas suficientes, falta de perícias, ou seja, inquéritos mal feitos ou insuficientes para o oferecimento de denúncia – resultado: a sensação de impunidade aumenta pela ineficiência das polícias.
Após esse breve exame, o ponto seguinte nos aponta para o âmbito do município e o papel a ser desempenhado pelas Guardas Municipais e a pretensão de se municipalizar a atividade policial como uma tendência a ser experimentada.
Mas sobre isso continuo na próxima semana.